Atenas tem quatro milhões de habitantes e, no verão, dois milhões de turistas. É uma das cidades mais antigas do mundo, onde viveram Sócrates, Platão, Ésquilo, Sófocles, Aristófanes… A lista é extensa.
A vista da Acrópole, onde fica o Partenon, construído em homenagem à deusa Atenas e à criação do homem, domina a cidade.
À noite, iluminado, ou durante o dia, o Partenon é de uma imponência ímpar. Mesmo em obras de restauração. É considerado o símbolo do poder de Péricles, estadista e personalidade política do século V a.C., que o mandou construir e governou durante o chamado “século de Péricles”, quando a democracia e o sistema jurídico atenienses alcançaram o ápice.
Estudos e técnicas modernas descobriram que estátuas e monumentos gregos hoje em mármore branco eram originalmente coloridos. A cor se perdeu com o tempo. E foi também com o tempo que outros países se deram o direito de saquear os tesouros de Atenas, contrabandeando-os para os mais respeitados museus do mundo. A ponto de, certa vez, um revoltado cidadão ateninese, com uma espingarda nas mãos, tentar evitar esses saques – infelizmente, sem conseguir.
Ao lado do Partenon fica o templo de Erecteion, dedicado ao rei Erecteu e construído durante a Guerra do Peloponeso.
Nele, figuras femininas esculpidas em mármore – as Cariátides – fazem as vezes de colunas. Esse conjunto é também chamado Pórtico das Virgens.
No Museu da Acrópole há tesouros como estátuas e segmentos do friso do Partenon, assim como registros do antigo cotidiano grego. Há também espaços vazios especialmente construídos para abrigar peças roubadas pelo diplomata inglês Thomas Bruce, o lorde Elgin, que se encontram no Museu Britânico, em Londres, as quais desde meados do século XX o governo grego pede sejam devolvidas.
Um pouco adiante está o Templo de Hefesto, chamado Vulcano pelos romanos. Deus do fogo, dos metais e da metalurgia, seu templo é o mais bem preservado de Atenas, com colunas intactas, talvez por ter sido transformado numa igreja cristã no século VII d. C, e mais tarde, durante a dominação otomana, na principal igreja ortodoxa da cidade.
As esculturas do frontispício, relativamente conservadas, representam cenas de lutas e interações entre homens e animais.
Impressionante é a magnitude do Templo de Zeus, que originalmente tinha 104 colunas de 17 metros de altura por 2 de diâmetro.
O templo é um bom exemplo da explosão de criatividade que as liberdades individuais e a igualdade propiciaram ao povo grego. Outras sociedades da época, como a egípcia, consideravam o poder autocrático indispensável à ordem.
Já pelos valores sociais gregos, a ordem não era incompatível com as liberdades individuais. Prevaleceram o racionalismo, o espírito do individualismo e a livre escolha dos cidadãos, que propiciaram o surgimento de tão expressivas obras de arte. E – nunca é demais lembrar - da democracia.
Visitar Atenas é emocionar-se com as marcas do passado – incontáveis ruínas de monumentos construídos por uma civilização que glorificava o ser humano como medida de todas as coisas – e também conviver com o drama do presente, a crise econômica que corrói a economia do país, cuja taxa de desemprego é 25%, e, entre os jovens, 50%.
Chegamos à Grécia dois dias após a vitória do Oxi – o “não” que o povo respondeu ao plebiscito governamental sobre as imposições da União Europeia: aumento de impostos, corte de gastos e reforma da previdência. O governo socialista de Tsipras defendia o Oxi, e cartazes oficiais mostravam isso. Mas a população também rechaçava fortemente as exigências, o que se podia verificar pelas pichações em vários pontos da cidade, reproduzidas aqui.
“A Grécia não se vende”, disse-me uma grega sobre a crise que o Instituto de Investigação Econômica Leibniz disse ter beneficiado a Alemanha em mais de 100 bilhões de euros e, em menor proporção, os Estados Unidos, a França e a Holanda.
A situação é complexa. A vitória do Oxi trouxe esperança de ampliar a liberdade de negociação e a afirmação da soberania do país frente à União Europeia. Mas, com uma dívida considerada impagável e a falta de solidadariedade da Europa, a economia grega está no olho do furacão, e acordos desfavoráveis lhe são enfiados goela abaixo. Embora a Alemanha tenha tido sua dívida perdoada após a Segunda Guerra, Angela Merkel não considera a grandeza de fazer o mesmo em relação à Grécia.
O país se mostrava dividido. No dia seguinte à nossa chegada, a Praça Syntagma – a mesma que tinha acolhido protestos anti-austeridade na semana anterior – foi palco de manifestação favorável à aceitação das exigências dos credores internacionais, embora a maioria do povo tivesse manifestado o contrário no plebiscito.
Enquanto isso, os bancos, fechados por precaução governamental, liberavam só 60 euros por dia aos correntistas em longas filas diante dos caixas eletrônicos.
Mas os turistas não eram afetados por esses problemas. E Atenas não se resume a ruínas históricas e crise econômica. A cidade é uma delícia. De certa maneira nos sentíamos como no Rio: as pessoas são relaxadas, simpáticas, hospitaleiras e se vestem de maneira descontraída, como os cariocas.
De dia ou à noite, passear pelo charmoso bairro de Plaka, no centro histórico, é a melhor pedida. Turistas e locais se confraternizam, tavernas colocam mesas nas calçadas, lojas de suvenires ficam abertas até tarde e músicos de rua animam o ambiente.
Outro bairro interessante é Psiri, onde ficamos. Pertinho do nosso hotel, a taverna Ta Kapamanaiaika, ou Karamanlidika, cuja gerente é uma espanhola que nos ajudava a entender o cardápio, oferecia deliciosos mezedés – petiscos típicos para serem comidos acompanhados por vinho ou cerveja. Folha de uva recheada com arroz e pinhões; pasta de grão de bico, coentro e alho; berinjelas recheadas com pasta de cebola, tomate e ervas; taramosaláta – pasta de ovas de vermelho com pão ou batata eram apenas algumas das guloseimas com as quais nos deliciávamos.
Também em frente ao hotel havia uma espécie de feira livre, com cerejas, pêssegos e outras frutas, além dos fantásticos tomates gregos e azeitonas de variados tipos, cores, sabores e tamanhos. Lojinhas de bugigangas, que aparentemente nunca se fechavam, expunham objetos inusitados.
Perto, mercearias vendiam uma variedade inesperada de nozes, amêndoas e outras frutas secas, além do famoso sal cor-de-rosa do Himalaia.
No capítulo “figuraças”, um dos poucos mendigos que vimos segurava uma cruz ortodoxa e um terço, e um homem de chapéu de palha, barba comprida e saia negra passeava distraído lendo algo que parecia deveras interessante.
Outras figuraças são os guardas do Parlamento e seu curioso balé, registrado em vídeo por Jitman Vibranovski.
Delfos: conhece-te a ti mesmo
A duas horas e meia de Atenas estão as ruínas de Delfos, Patrimônio Mundial pela Unesco. Chamada pelos antigos de Umbigo do Mundo, Delfos era um lugar sagrado, o centro religioso da civilização helênica. Lá ficavam o Templo de Apolo e o famoso Oráculo, onde há a inscrição “Ó homem, conhece-te a ti mesmo e conhecerás os deuses e o universo”.
O Oráculo de Delfos exerceu grande influência na Grécia e em países próximos, como Macedônia e Egito, cujos políticos e estadistas frequentemente recorriam a ele. Mas também cidadãos comuns o procuravam para indagar sobre problemas cotidianos, amorosos, financeiros e até meteorológicos. A mitologia e a dramaturgia gregas descrevem heróis e personagens, como Hércules e Édipo, consultando-o para saber os mistérios de seus destinos.
As respostas eram consideradas verdades absolutas. Mas o Oráculo – que funcionava no templo de Apolo, onde as sacerdotisas, ou Pitonisas, faziam profecias em transe - era às vezes ambíguo: o rei Creso da Líbia o procurou antes de atacar a Pérsia, e recebeu o aviso de que, se o fizesse, destruiria um grande império. Mas foi derrotado. Quando acusou o Oráculo de ter feito uma predição falsa, recebeu a resposta de que, de fato, um grande império tinha sido destruído: o dele.
Em agradecimento às consultas e aos benefícios advindos delas, Delfos recebia valiosas doações, e se tornou um centro de influência também financeiro. Em volta do Templo de Apolo havia capelas chamadas Tesouros, onde as oferendas eram guardadas. A mais importante, e única restaurada, é o Tesouro de Atenas, vista abaixo.
O teatro, de onde se descortina vista panorâmica do vale de Delfos e do santuário de Apolo, podia receber cinco mil pessoas em suas 35 fileiras de assentos. Foi construído no século IV a.C., e remodelado diversas vezes.
De acordo com a mitologia grega, a esfinge tinha sido trazida da Etiópia para Tebas pelos deuses Hera e Ares. Leão alado com cabeça de mulher, cauda de serpente e asas de águia, era um demônio de destruição e má sorte. O enigma “que criatura anda com quatro pernas pela manhã, duas à tarde e três ao anoitecer” foi decifrado por Édipo, depois de dezenas de pessoas terem sido estranguladas por não o conseguirem. O nome esfinge deriva do grego sphingo e significa estrangular.
O Museu Arqueológico de Delfos tem achados arqueológicos do santuário de Apolo e arredores. A esfinge e a estátua do belo Antinoo – favorito de Adriano, elevado por ele à categoria de semi-deus e citado por Marguerite Yourcenar em “Memórias de Adriano” – fazem parte do acervo.
Jóias, artefatos de decoração e objetos votivos são representativos da época de maior prosperidade, influência e prestígio do santuário.
Curioso é o que se diz da imagem de Apolo tendo ao lado uma ave: o dito popular “um passarinho me contou” seria derivado dessa imagem, em que Apolo recebe notícias de seus casos amorosos por intermédio de um pássaro.
Olá Cláudia! Sou Diego Lima, estudante de Jornalismo de Atibaia/SP. Estou elaborando uma monografia com o tema "A presença das mulheres no telejornalismo esportivo" e gostaria de uma entrevista com a senhora que, além de jornalista, é socióloga acerca de como as mulheres vêem conquistando o espaço no cenário telejornalístico no Brasil. A senhora poderia nos conceder? Obrigado!
ResponderExcluirOlá, Diego, entre em contato comigo por email para conversarmos a respeito: claudiaversiani@gmail.com.
ExcluirPaís incrível que o mundo todo precisa conhecer - e lá se vê gente de todo o mundo. Estive na Grécia em 2011, em plena crise, mas nem as greves que resultaram no fechamento de alguns museus, serviram pra tirar a força e o encanto da viagem. Lá se pode sentir a grandeza do início da história do Ocidente - até nas inúmeras e terríveis marcas da depredação deixadas por outros impérios, incluindo a Inglaterra.... e a dignidade do seu povo, mesmo encarando a pobreza. Delfos é um lugar belíssimo. E Atenas, uma cidade bonita e limpa : em plena greve do serviço de coleta de lixo, podia-se ver que entre os montões de sacos de lixo que não eram recolhidos, as ruas e calçadas continuavam impecáveis. Das ilhas, nem falo, merecem um capítulo à parte. Mas pra quem quer viajar por terra pelo interior, recomendo uma visita a Meteora, um lugar pra lá de incrível. Vontade de voltar, dá mesmo!
ResponderExcluirQue registro maravilhoso, Claudia! Uma verdadeira aula de história e arte!
ResponderExcluirObrigada.
Bjs
AT
Lindo.
ResponderExcluirSuas impressões sobre a Grécia (Atenas e Delfos) são muito boas e interessantes, destacando-se o berço da civilização ocidental nas artes, arquitetura, escultura e ciência, mas também na democracia!
ResponderExcluirAs fotos e filme mostram a beleza dos lugares visitados e convidam logo o leitor a fazer a visita turística a tão belo país...
Parabéns pela mensagem geral mostrada!
Bruno.
Muito bom, Cláudia! Um paralelo interessante entre a Grécia antiga e a contemporânea, permeado pela política. O sentimento que permanece enquanto pisamos o solo grego é o de reverência por aqueles que nos deixaram tanta beleza e inteligência em seus poemas épicos, na filosofia, no teatro, nas artes e na política.
ResponderExcluirA Humanidade deve muito à Grécia. A retribuição não poderia ser menor que o perdão à dívida financeira que enriqueceu alguns bancos europeus. Zeus castiga!
Parabéns por mais um capítulo do seu blog!!!
Só vocês mesmos, Cláudia, para irem à Grécia justo agora.
ResponderExcluirBeijo
Que espetáculo! E que maravilha de texto, Claudia!
ResponderExcluirParabéns!
Sergio
Muito lindo, Claudia!
ResponderExcluirMesmo vendo as fotos pelo celular achei lindas e o texto está saboroso!
Parabéns!
Beijos,
Barbara
Belas fotos! Bela reportagem! Beijos!
ResponderExcluirOtimos textos! Muito obrigado,
ResponderExcluirPedro Henrique
Viajei contigo!
ResponderExcluirMuito legal Claudia
ResponderExcluirparabens pelas fotos maravilhosas
adorei!
Bjs
Vi e degustei com calma. Imagina alguns bancos enxotarem esse país da União Europeia!
ResponderExcluirContinue viajando.
C.B