sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Anavilhanas

O que eu mais gostava, quando dizia que íamos a Anavilhanas, era o espanto do interlocutor (“ahn?”) e as perguntas que se seguiam: onde fica? no Caribe?

O Brasil não conhece o Brasil, já disse Aldir Blanc. Pra quem não sabe, o Parque Nacional de Anavilhanas é o segundo maior arquipélago fluvial do mundo, com cerca de 400 ilhas, e fica no Rio Negro, Amazonas.

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O Rio Negro tem águas realmente negras, gosto amargo e ph ácido, o que faz com que, felizmente, não tenha mosquitos. Nasce na Colômbia e, já no Brasil, depois de unir-se ao Solimões – quando se dá o famoso encontro das águas, de que trataremos adiante -, forma o Amazonas.

Para chegarmos a Anavilhanas voamos até Manaus, onde o hotel  manda buscar os hóspedes. Achávamos que iríamos de barco, mas uma ponte contruída há pouco leva à outra margem do rio, e em três horas chegamos ao nosso destino, o hotel de selva que seria nossa base para conhecer o arquipélago.

Passear pelos igarapés e igapós é uma experiência inesquecível: árvores imensas, centenárias, com os troncos submersos. Em julho, quando fomos, já era época da vazante, mas o rio ainda estava dez metros acima do nível habitual. É um espanto para nossos olhos citadinos quando nos damos conta de que estamos vendo apenas a copa das árvores, e que há dez metros de troncos debaixo d’água. 

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O hotel organiza diversos passeios para os hóspedes. A pescaria de piranha (abaixo) é um deles. Mas é uma diversão sem agressões à natureza, pois as piranhas pescadas são, em seguida, jogadas na água. Vale pelo lindo visual do rio e da floresta alagada.

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   Outro passeio é às comunidades ribeirinhas, onde vimos pássaros como gavião e arara.

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Imprescindível é conhecer os botos cor de rosa, lindos. Eu não tinha ideia de quão cor de rosa eles são.

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Os botos, selvagens, alegres e brincalhões, vivem soltos. Mas todos os dias, em determinada hora,  chegam a esse lugar onde são alimentados, fotografados e admirados.

À noite o hotel promove excursões de barco, que percorre as ilhas e permite que os turistas vejam e fotografem animais de hábitos noturnos, entre os quais esse sapinho à direita.

              P1090343 bx                                                                       O hotel tem boas instalações, bem integradas à natureza. Bangalôs, deque com piscina em frente ao rio, mirante, redário para descanso, sala de jogos e de televisão (argh – quem quer TV naquele lugar paradisíaco?).

Numa noite, na hora do jantar, percebemos uma visitante no teto do refeitório: essa senhora negra à esquerda. Sem dramas. Os invasores éramos nós.

  Tudo é novo e intrigante. Mas a verdadeira epifania é o nascer do sol. Pegamos o barco com o dia escuro, a estrela D’Alva ainda no céu.

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O dia vai nascendo num transmutar de cores impressionante. Todos se calam para apreciar a força da natureza e ouvir os ruídos dos animais acordando.

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Finalmente o sol aparece, bandos de pássaros passam voando e a festa do dia se instala.

Em cima das árvores vimos casais de papagaios, aves monogâmicas que podem viver até 80 anos ao lado do mesmo par.

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Depois de cinco ótimos dias, na hora de ir embora o programado era voltar de van, como tínhamos ido. Mas uma novidade foi irresistível: o hidroavião que, com quatro passageiros mais o piloto, sobrevoou o arquipélago e pousou em  Manaus no mesmo rio Negro.

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Em Manaus, muitas atrações. O porto, por exemplo, de onde partem barcos para toda a Amazônia, é uma delas. As embarcações saem cheias de passageiros com redes e bagagens. São o meio de transporte mais viável naquela região carente de estradas e com tantos rios.

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   Há um mercado só de bananas, de todos os tipos e tamanhos. Outro, onde a estrela é o peixe.

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A cidade não é bonita, mas guarda tesouros da época áurea da borracha.

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De todos, o mais belo é certamente o Teatro Amazonas, inaugurado em 1896, no auge do fausto do Ciclo da Borracha.Tombado pelo Patrimônio Histórico em 1966, foi restaurado em 1990, e promove festivais de ópera, teatro, música e dança.

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Visitas guiadas mostram os detalhes da arquitetura, dos afrescos e  demais ornamentos. Com linda cúpula externa de telhas vitrificadas e escamas em cerâmica esmaltada, o teatro é a principal atração da cidade.

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No entorno de Manaus pode-se ver o famoso encontro das águas escuras do rio Negro e das barrentas do Solimões.

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Os dois correm paralelos por cerca de 6 km, sem que se misturem, com velocidades, densidades e temperaturas diferentes. Colocando a mão dentro d’água, é possível sentir a diferença de temperatura: 28 graus do Negro e 22 do Solimões. É curioso.

Perto estão as comunidades ribeirinhas, que vivem em casas flutuantes.

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     Barcos escolares transportam as crianças para o colégio.

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  As famílias criam animais silvestres, e ganham alguns trocados exibindo-os aos turistas.

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             Meu preferido é a preguiça, bichinho que tem os movimentos ultralentos e parece estar sorrindo.

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 Próxima postagem: Natal, RGN

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Camboja, a fênix

O turismo no Camboja se concentra basicamente em Siem Reap. Lá está Ankor, com as deslumbrantes ruínas da civilização Khmer, que ocupam 400 km2 e no final do século XIX foram descobertas pelos franceses, que durante 90 anos dominaram a região.

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Ankor foi a capital do Império Khmer, que floresceu do século IX ao século XV. Por motivos ignorados, essa civilização entrou em decadência, e a cidade foi coberta pela floresta. Quando os franceses descobriram o conjunto de templos e palácios, não lhe deram importância, e Ankhor permaneceu abandonada. Os colonizadores não quiseram se ocupar do que talvez lhes parecesse inútil.
     Mas depois de todas as reviravoltas políticas – independência do domínio francês, guerra do Vietnã, ascenção e queda do sanguinário Khmer Vermelho – a região renasceu, não só para os turistas, mas para o povo cambojano.

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O país abriu-se para o turismo em 2001. Dessa data até 2010, foram construídos nada menos que onze hoteis por ano em Siem Reap, para abrigar os 2.5 milhões de turistas que chegaram em 2011 – e que deverão somar três milhões em 2012 e quatro milhões em 2014.
    O povo se esforça para atender às expectativas. Gentilíssimos, os que lidam com turistas aprendem idiomas, frequentam cursos de hotelaria e fazem questão de atender com presteza às solicitações.
    Diz-se que o Egito é um presente do Nilo. Pode-se dizer que o Camboja de hoje é um presente de seu povo, que sofreu horrores durante a ditadura de Pol Pot e agora ressurje das cinzas do genocídio perpetrado pelo Khmer Vermelho, que exterminou  cerca de um terço da população do país.

 

Siem Reap quer dizer Tailândia – Siem: o antigo Reino do Sião - derrotada. No conflagrado Sudeste Asiático ocorreram, ao longo dos séculos, muitas escaramuças entre os países limítrofes - Tailândia, Vietnã, Laos e Camboja.  

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Ankor é o cartão postal, não só da cidade, mas do país. As ruínas, com belíssimas esculturas de pedra, em três dimensões e baixo relevo, ilustram a bandeira nacional e as notas do dinheiro cambojano, o que dá ideia da relevância desse patrimônio. Os mais atentos terão notado que a moldura do blog é um dos baixos-relevos lá existentes.

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Pesquisas recentes atestam que em Ankor havia uma população de meio milhão de habitantes, o que o configuraria como o maior assentamento pré-industrial da História de humanidade.

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Durante o tempo em que Ankor foi esquecida, a vegetação tomou conta do lugar. Hoje, raízes de árvores centenárias enlaçam as ruínas.

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      Turistas e locais estão em toda parte...

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                                                                                                                                                                                … e cada um se diverte como quer.

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Conjuntos musicais formados por mutilados de guerra se apresentam, e mulheres passam com o rosto inteiramente coberto, estranho comportamento observado também em outros países do Sudeste Asiático. A explicação é que estão se protegendo do sol e do ar poluído.

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À noite, nada como um show de danças típicas. Ligue o som e escute a original melodia no vídeo feito por Jitman Vibranovski.

 

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Depois, um passeio pela cidade, para ver as luzes se refletindo no rio e fazer compras no mercadinho de artesanato, onde há objetos típicos, em especial bonitos lenços e echarpes de seda pura, a preços mais que convidativos. 

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        Para finalizar, um vídeo feito em condições precárias por Jitman Vibranovski, no qual nosso guia, Chhun, conta parte dos horrores que sua família viveu quando o país esteve sob o jugo do Khmer Vermelho. Os cambojanos foram expulsos de suas casas e levados para campos de concentração, onde tinham que trabalhar no cultivo de arroz e recebiam alimentação escassa. Não lhes era permitido sequer plantar para comer. Só podiam se locomover a pé. Bicicletas, motos e mesmo objetos como relógios ou óculos de grau eram proibidos. Enquanto isso, o país se tornava o maior exportador mundial de arroz.

       Esse regime de terror durou três anos, oito meses e vinte dias, nas contas de Chhun. Mas foi o suficiente para eliminar três milhões de cambojanos, mais de um terço da população. Monges e professores – cerca de 16 mil intelectuais - foram os primeiros a serem assassinados. Os exilados do regime anterior foram chamados para ajudar na reconstrução do país, para onde regressaram esperançosos. Mas, ao chegar, iam do aeroporto para os campos de extermínio, onde, para economizar munição, eram mortos a pauladas.  A irmã do nosso guia, de apenas três anos, morreu de fome, pois a mãe não tinha como alimentá-la no campo de concentração onde viviam.

       Depois de libertado pelo Vietnã - que invadiu o país – o Camboja renasceu das cinzas. Hoje, a maior parte da população tem menos de 32 anos, pois a geração anterior foi praticamente dizimada. Os líderes do regime genocida, tido como um dos piores da História, foram julgados e presos. No início de 2012, Kaing Guek Eav, um dos integrantes, foi condenado à prisão perpétua. Pol Pot, mentor do Khmer Vermelho, morreu em 1998. 

       O filme “Os gritos do silêncio”, feito em 1984, retrata, de maneira bem próxima à realidade, a situação do país sob o regime de Pol Pot.

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